quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Bom selvagem

O princípio fundamental de toda moral sobre o qual raciocinei em todos os meus escritos é de que o homem é um ser naturalmente bom, amando a justiça e a ordem; que não há perversidade original no coração humano e qu eos primeiros movimentos da natureza são sempre retos.

O apetite dos sentidos tende ao corpo e o amor da ordem, ao da alma. Este último amor, desenvolvido e tornado ativo, traz o nome de consciência, mas a consciêmcia não se desenvolve e não age a não ser com as luzes do homem.

Quando afinal todos os interesses particulares agitados se entrechocam, tornando o universo inteiro necessário a cada homem, torna-os todos inimigos natos uns dos outros e faz com que ninguém encontre seu bem a não ser no mal de outrem. Então a consciência, mais fraca que as paixões exaltadas, é abafada por elas e não fica na boca dos homens mais do que uma palavra feita para se enganarem mutuamente.

Cada qual finge então sacrificar seus interesses aos do público e todos mentem.

Ninguém quer o bem público a não ser quando concorda com o seu.


Então, prezado Rousseau,

travam-se as mais cruéis batalhas no seio daqueles que deveriam se aliar.
Matam-se os irmãos, por que o interesse sempre foi apenas o de posse.

Mas, estimado Rousseu, acreditemos no bom selvagem.
Eu acredito.
Comentário a excerto de Carta a Beaumont, Rousseau


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quinta-feira, 20 de agosto de 2009

PT

Eu estava no comício.

Nascia uma estrela.
Uma esperança.
Acreditávamos.


Céu encoberto:
arquivamentos.
Todos.


Deu PT.
Perda Total.


O pior é estar acontecendo essa baderna.
É, de nossa parte, cidadãos, não acontecer nada.
O pior não é o mal acontecer.
É virar rotina.

É o anestesiamento.

Quem sabe Marina nos faça o favor de não pintar o rosto.

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Revolução sim; Reforma não

"Eles têm tudo."

Agora é teem não tem mais acento.
É teem mesmo? É.
Acho que é.

As pessoas entregam sua idade pela forma de escrever.

Quem acentua "estrêla", tem mais de 60 anos.
Eu vou ter minha idade revelada pelo acento no têm.

Mas mesmo assim, NÃO VOU ABRIR MÃO DESSE ACENTO NÃO!!! Nem vou escrever autorretrato! Para mim será sempre AUTO-RETRATO!!

JIBÓIA, PLATÉIA, BÓIA.
Eu me gabava de escrever sempre certo, com acento.
Agora sou um zé ninguém.
Pelo menos ninguém ainda tem acento.

Eu tenho muitas dúvidas de português ou sobre a vida. E tenho três anos para respondê-las.
Depois é PAU!

Eu comprei a nova gramática.
Li. Reli. Treli.Tem tanta exceção que dá enjôo (não tem mais acento, viu?). A exceção é a regra. (Não: eu não volto pra 1º série por que a professorinha não vai saber nada da nova reforma. Vai estar caquética fazendo cursos de reciclagem e aprendendo a ser professora. E olha lá se não escreve estrêla!)

Até os gramáticos e especialistas estão se enrolando. Já saíram pelo menos que eu sei três edições revistas da reforma. Ninguém entende nada!!

Levanto agora uma bandeira: abaixo a reforma!
Todos os seguidores do meu blog vão aderir e vamos fazer uma revolução.
Não pense que são só esses três não: tem muito seguidor oculto que não põe a cara! A tática é de guerrilha!!

Abaixo a reforma!
Viva a Revolução!
Eles têm que aceitar: por bem ou por mal!
Não é mau não, hein!?

Guerra Santa

Está de volta a Guerra Santa.

Agora na era digital.

Os fiéis indignados, blasfemam: "não vemos mais a Rede Globo! Nem de passagem!"


Sei.
Ahã.
Conhece "da boca pra fora"?
É um Coral do Conservatório de Tatuí. Muito bom.

A fé arrebanhada em doações de interessados em "comprar" seu terreno no céu. Mas muitos não querem pagar o IPTU. Afinal, eles são de deus.
O demônio são os outros, como diria muito mais profundamente Sartre. Mas esses "fiéis" não vão entender. Só paga suas contas em dia os arautos do demônio. Os fiéis acreditam ter o aval de deus para avacalhar com as leis humanas.

Eles arrebentam tudo fazendo da Bíblia sua espada de guerra.
Homens submetem mulheres a sustentá-los, afinal "são a cabeça da família".
Ficam assim, vendo televisão à tarde, enmcasa, com cervejinha no braço do sofá, enquanto a mulher trabalha como louca vendendo sanduíches na barraquinha na rua.
Mulher tem que ser submissa. A ele.

Outros fingem-se de virgens de dia e à noite saracoteiam nas festas country, com roupas que nem a Dercy Gonçalves usaria. Mas isso não é o pior (isso não é nada).


O pastor olha as pernas da irmã que usa sim mínissaia. E se insinua. Mas ele não é pastor e casado? Mas deus quer assim... Afinal a irmã é que está atentando o puder.

Ou então colocam bebidas alcóolicas escondidas nas festas. Um golinho para o demônio.

Não pagam e não avisam.
Enganam.
Mentem.
Reproduzem os piores exemplos de falta de ética e urbanidade nas relações sociais.

E gritam exclusividade de deus. Esse povo é que se auto-intitula emissário da boa-nova.
Esse povo diz que não vai ver nem de relance a Rede Globo.
Sei.
Se hipocrisia matasse...


Do outro lado, temos a vênus platinada da verdade.
Quem não sabe como são erguidas as riquezas dos mensageiros de deus?
Os "fiéis" - fiéis a seu egoísmo de arrebatar seu lote no céu e dane-se o outro - doam por que querem. Fi-lo por que qui-lo.
Se doam mais é por que esperam mais retorno. Nada de amor desinteressado pela obra de deus.
E a platinada agora carrega a espada de São Jorge contra os enganadores dos pobres.

Guerra Santa: pela audiência. Elas - redes de tv ou igrejas - querem mais fiéis.
Os fiéis que seguem novelas, que compram detergente, que consomem salmos. Querem exclusividade. Vendem um deus que ama só alguns, os escolhidos que doam dinheiro ou alugam seus olhos. Dá na mesma.

Tudo vale pelo palácio em Campos do Jordão.
Ou em qualquer outro lugar. Sabemos como funciona o esquema.
O deus, para eles pastores ou fiéis, é dinheiro. No seu bolso.

Quem afinal entregaria sua orientação de crescimento espiritual para uma bispa-perua??

Desses "cristãos" quero distância.

Assim como dessa guerra santa-do-pau-oco.

Deus, espero, não está interessado em dinheiro.
Mas em "paz e amor".
Como em Woodstock.

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Distância

A distância é um fenômeno paradoxal.

Tantas pessoas distantes se fazem tão presentes. Amigos em outro país, por exemplo.
Amigos inesquecíveis não precisam do convívio. São eternos.
Quando os encontramos, parece que foi ontem a última vez, mesmo que tenham se passado anos.
Lembramos e revivemos tudo. O coração pulsa.
Aqui, a distânia não existe.


Outras vezes, ela é implacável.
Em relacionamentos frágeis, dificultosos, ela vai apagando o que existia.
Vai ficando longe, as poucas histórias vão definhando.
Como em famílias doentes.
As últimas lembranças a irem embora são as ruins, como num último suspiro.
E a vida segue seu rumo com pessoas que pareciam ser tão importantes na sua vida deixando de existir. Virando fantasmas assombrados. Não fazendo falta alguma. Pior que mortas.
Aqui a distância é real e ajuda a esquecer o nada.

A distância é sábia: seleciona a convivência.

Filosofia da Dúvida

Poder da Dúvida: perguntar expõe o status quo.

Pode estar desmoronando uma estrutura osteoporizada.

Descartes: Colocar o conhecimento em suspenso.

Não afirmar categoricamente traz a tona a possibilidade de estarmos todos flutuando.

Dúvida ameaçadora: “você duvida que eu faça isso?”
Dúvida desestabilizante: “duvido que você faça isso”
Dúvida impulsionadora: “duvido que você consiga”
Dúvida aterrorizadora: "Por que sempre fizeram assim?"
Dúvida que remove entranhas: "Não admito que me pergunte isso".

Eu só sei que nada sei.

E você?
Sabe o quê?

Perguntar irrita aquele que pensa que sabe bem um assunto, mas que se vê “desmoralizado” Pode parecer irônico a quem é submetido a perguntas.
Mais seguro falar do que se sabe e esquecer do que não se sabe.

Conhece-te a ti mesmo: duvide.

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Violino

Não há nada
de tão grande
tão insuportável
que não se possa viver.

Uma música estranha
som contínuo
fundo finito
que a gente devora.

E na avenida
sentadas na escada
que leva ao vão
esperamos o pior.

Que não virá.

Porque nada
é tão grande
tão insuportável
que não possamos
olhar do alto da escada
e sorrir.


(para minha irmã)

Bis

O Mar e a Música
são irmãos
filhos do Infinito e da Delícia.

Ouça tua música
desnude
as sereias
os dourados
as estrelas-do-mar
que carregas
no teu mais profundo oceano.

Que teu horizonte
seja alcançado
com tuas remadas precisas
porém encantadas
como convém a um boto.

Que teu mar escorra
na forma mais infinita e deliciosa
de música que existe:
a vida em cada porto.

Concerto

A vida se faz semifusa
quando homens
de olhar sincero
se enganam
com o ópio verde do depois
deixando estrangular ações
emoções
revoluções.


Pausa.


Morrem disfarçados de felizes
Com carinhas de anjos
Hipocritamente em pausa
Na pausa do desespero
De tomar do fantasioso cálice
Abençoado.

Rock dourado

grita guita
dourada
esvoaçante como tua crina
em fogo
que arde nos dedos
num choro sambado de rock
azulverdeamarelodourado


bandolim
da beleza
da coragem
do sim




(para Nei Marques)

Maestro

Todas as músicas
sementes
brutas
na terra

Na mão
a pá
fura espeta cavoca assenta
acaricia
acolhe
colhe
recolhe

No olhar a seiva
que germina
em flores em tons
de todas as cores

No gesto,
o maestro.
Na alma,
Jardim.

(para Gil Jardim)

Leia

NÃO É IMPORTANTE

QUE

VOCÊ GOSTE DOS MEUS ESCRITOS.



É, SIM, QUE VOCÊ OS LEIA.




ASSIM NÓS DOIS NOS TRANSFORMAMOS.

Jazzístico

Todos agora
têm direito
à liberdade
frases no ar
improvisos.




Outsiders.

Blues

a porta
se fecha
e uma dor
de partida
se abre

como se fosse
a última.

Pau de Chuva

No peito corre um rio
rodeado de árvores copadas

Descansa...

Molha teus pés em mim
Sacia tua fome
nos frutos divinos que trago
Perde teu tempo
nos passeio dos meus peixes
Segue o vento de mim.

Respira fundo e fecha os olhos
ouve a paz
o som do calor
do verde.

Mergulha e vira boto
Nada para nosso infinito
Brinca.
Ri.Descansa.

voz

VOZ


A dela
tão dela
tão linda...

VIXE! QUE COISA MAIS LINDA!

mais grave
mais agudo
mais rasgado
mais doído
mais um pouco
irreverências mil
na voz que era um fuzil


PADAPATRITRITRITRITRIPADORRÉ
TRIPADORRÉ
TRIPADORRÉ!

BAIXO

aperta
o peito
trava
a garganta
umedece
o olhar
acalma
o ouvido


e


dói.



(para ZÉ ALEXANDRE)

De palheta

E foi com um sopro.


Sopro divino
de um ser iluminado
Um mago
que não anda,
flutua;
não fala,
cria;
não toca,
gera.


Alquimista
que transforma ar
em êxtase.



(para PAULO MOURA)

Viola rio acima

Descobrir o prazer


calmo
como um rio
forte
como uma cachoeira
livre
como um pássaro.



o prazer.

Cítara

Sentar na pedra
tempos sentindo
vai-e-vem
ondas e mar

Deita na grama
imaginando
formas infinitas
nuvens no peito

Subir no topo
bebendo prateado da lua
nova na noite

Tudo apenas se move se vive
se transforma com a lua cheia
depois vazia
depois cheia de novo
depois vazia
depois cheia
e vazia e
cheia de vida.

Batuta

A CANÇÃO MAIS LINDA É AQUELA
QUE A GENTE ESPERA


ACHANDO QUE NÃO VAI VIR
E VEM


PENSANDO QUE NÃO EXISTE
E TEM

morte

Talvez a morte se assemelhe

À geleza

De um sorriso-conveniência;

À morbidez

De um ensimesmamento;

À inatureza

De uma dissimulação;

À solidez

De uma sólida solidária solidão





Entre nós



Humanos.

BOCA NO TROMBONE!

O homem quer ser mais que apenas ele mesmo. Quer ser um ser total. Anseia uma plenitude que sente e tenta alcançar. Se fosse da natureza do ser humano não ser ele mais que um indivíduo, tal desejo seria absurdo e incompreensível, pois como indivíduo ele já estaria então pleno, já sendo tudo que seria capaz de ser. Esse desejo do homem de se desenvolver e se completar indica que ele é mais que um indivíduo. Que almeja ser cidadão.

Para conseguir ser um artista é necessário dominar, controlar e transformar a experiência em memória, a memória em expressão, a matéria em forma. A emoção não é tudo: ele precisa saber tratá-la, transmiti-la, conhecer as regras, técnicas, recursos, formas e convenções com que a Natureza se sujeitada à concentração da arte.

Nesse mundo alienado em que vivemos a realidade social precisa ser mostrada no seu mecanismo de aprisionamento e de aculturação. A valorização da cultura é a raiz forte e profunda da evolução de uma nação.

A arte é necessária para que o homem se torne capaz de conhecer e mudar o mundo. Mas também é necessária em virtude da magia que lhe é inerente.

A função da arte



A ARTE É O MEIO DE UNIR O HOMEM À PLENITUDE.

PAZ INTERIOR

Que dizer da guerra?

De qualquer tipo de guerra. Inclusive as cotidianas.


Assim como o príncipe de Maquiavel, o guerreiro sabe que a ferocidade do espetáculo faz o povo ficar ao mesmo tempo satisfeito e estarrecido; matar de modo espetacular ergue o reinado do medo, uma pacificação total, pois quem irá contra o poderoso? Ou, como o Soberano de Hobbes, dá conforto e preserva-se pelo medo também?

Mas quem ousaria dizer-se diferente?
Quem dentre nós sabe-se equilibrado, prudente, moderado?
Quem quer ser considerado pusilânime?


Os deuses primeiro cegam àqueles que querem destruir, segundo a mitologia grega. O herói trágico erra pelo excesso de querer acertar. Sua hybris, seu destempero, em querer ir até o fim pode cegar como fez a Édipo, que fugindo do destino cada vez mais estava nele. A sensação de sentir-se menos, humilhado, ultrajado, cega. E é preciso lutar.

Mas nós, mortais, cegos por vezes como semideuses, por motivos bem menos divinos: medo, ódio, orgulho, vaidade, hostilizamos. O bushismo, atacar para se auto-afirmar, muitas vezes pode estar em casa. Quem nunca usou de autoritarismo, leia bem, digo autoritarismo e não autoridade, dentro de casa ou no trabalho? Quem nunca agrediu com palavras? Com gestos? Com olhares? Com silêncios?

Quem nunca abusou do poder?
Quem?


Muitas manifestações de paz pelo mundo. Na base de pedras, agressões, raiva, ódio. Policial que tem por função defender e proteger, atacando. Pessoas invadindo embaixadas. Homens-bomba explodindo. Tudo pela paz. Tudo pela paz?


Esta guerra que acontece ao vivo em cores, com hora marcada, como um espetáculo criteriosamente ensaiado e dirigido, é, ao mesmo tempo, vergonha nessa altura da civilização e ocasião para reflexão, principalmente autocrítica. Como o ideograma oriental que traz em si a crise e a oportunidade. Que seja o momento da busca imediata da paz interior, como reflexo do que se deseja ao mundo. À nossa Terra, mãe que crê em filhos amorosos. Busquemos o retorno: natureza e não ecologia; infância e não pedagogia; desejo e não sexualidade. Menos cientificização e mais vida. Menos tecnologia e mais humanidade. Ou estamos na Era da Caverna Cientificizada?
Por um momento espero que cada um se responsabilize pelo abstrato que é a humanidade e faça sua parte. Eu tenho vergonha de fazer parte deste instante histórico e proponho: paz interior.
De verdade.

O esteta

Defender a regionalização cultural pode ser facilmente comparado com "bairrismo". Mas não é.

O bairrismo hostiliza ou menospreza tudo quanto se refere aos demais: só que é meu (ou o que eu conheço) é o melhor. O outro, o diferente, o desconhecido, o novo, não merece nem mesmo consideração. Já escolho logo o que conheço, escolhendo, em última estância, eu mesmo, e estabeleço uma estética da ignorância, do provincianismo, da mesmice, de um tipo de fascismo e racismo. Num exemplo cotidiano: se a minha tia, meu irmão, minha escola está lá, numa apresentação artística, por exemplo, é o suficiente para que a coisa em si seja boa. Para que eu a escolha como boa. E no interior é quase impossível não acontecer isso.

Esse tipo de escolha é o mesmo caminho que sustenta seu oposto: a "globalização" da cultura. São roupas, informações, modos de viver, que se assume como próprio (olha o meu aí de novo) , negando o outro. Nessa suposta derrubada de fronteiras o que se faz é o contrário: ergue-se uma estética alienante cercada de auto valor por si mesmo. E só.

Mas então o que seria "regionalizar" a cultura? Seria começar um processo de auto-valorização verdadeira. Reestruturar-se a partir da única base honesta para a estética: a qualidade. Ela é que deve prevalecer na experiência sensível da arte e não o critério mesquinho de "se conheço, eu gosto, se é meu, eu gosto". Seria desprender-se de valores egoístas e mesquinhos e buscar a profundidade da experiência cultural.

Mas isso implica em esforço. E muito. E de todos.
Requer, antes de tudo, coragem para mudar.


Deixar de acreditar na mesmice - que paralisa, e dá uma certa idéia de conforto e partir para a ação. Acreditar que há muito que eu não conheço e pouco que tenho feito. É parte da sociedade agregar valor à estética, mobilizar-se em formas de apoio cultural (comerciantes, empresários, profissionais liberais, industriais) o que seria a carta de alforria da cultura em relação ao "mercado cultural" - que de cultural não tem nada. Seria jogar-se num imenso propósito de unir professores, empresários, artistas, em busca da qualidade. Abrir portas para a possibilidade cultural. Colocar um grupo de teatro, de música, de artistas em cada escola, clube, praça.

Exigir a construção de teatros, cinemas e livrarias para a cidade com o mesmo empenho que se exigem escolas, hospitais e creches. Exigir das televisões um mínimo vínculo com a realidade que se vive e não aceitar passivamente a novela sempre estrangeira ( seja mexicana ou carioca).Tudo isso é essencial para completude do ser humano, da cidadania. Preservar o artista, fazendo de si um mesmo. Fazer cursos de arte, ir a centros culturais, cinemas, ler.

Não se é humano sem arte. Ou se é apenas corpo.

Regionalizar a cultura é partir para a estruturação de um país melhor. É mudar o arquétipo do caipira burro, ignorante, iletrado, de modos rústicos, para o ser humano integrado com a natureza, com seus sentidos abertos para entendê-la, percebê-la, senti-la. Como uma pessoa que adota uma atitude requintada com relação à arte e à vida.

Regionalizar a cultura é acreditar que o caipira não é um bronco, mas um ser ligado essencialmente à experiência dos sentidos.
Um esteta.

Musicar

MUSICAR
(CONTRA O HORROR AO SILÊNCIO)


“Toda relação bem sucedida pode ser chamada de musical”
(Roland Barthes)



A indústria cultural, a cultura de massa, favorece no domínio da música em particular, o excessivo desenvolvimento de apenas consumir, em prejuízo do autêntico ato de musicar. O consumo em massa promovido e divulgado pela mídia, consegue refrear o desenvolvimento da cultura popular. O homem massificado adquire verdadeiro horror ao silêncio, precisando consumir, aqui musicalmente, continuamente. Quantos de nós já não presenciamos ou protagonizamos aquela fuga para o relaxamento – num sítio, fazenda, montanha – e demos de ouvido com aquele som infernalmente alto e ruim que vinha daquele carro equipado em aparelho de som? Ou numa compra em supermercado com som de uma rádio FM que de vez em quando toca um música (chata), nos intervalos de um locutor enlouquecido entre suas palavras sem fim e ruídos intermináveis? Ou naquela loja, experimentando roupa, a música contínua e péssima? Concessionárias em dias de “promoção”. Inaugurações. Festas em escolas: músicas que nem adultos deveriam ouvir! A música parece com uma cortina: ninguém repara, só quando tira. Ninguém ouve essa poluição auditiva. Ao menos conscientemente. Já pedi muitas vezes para abaixar o som de lojas e percebi o espanto: afinal, “nem dava para ouvir. E anima tanto...”
Quantas pessoas conhecemos que gostam de algum instrumento, que queriam tocar violão, saxofone ou cantar? Mas é tão difícil... O ensino de música nos Conservatórios é voltado para a formação de profissionais, tendo a preocupação principal dirigida ao treinamento instrumental ou vocal, e em segundo plano os cursos de composição. O intérprete musical – virtuose, técnico – libera o ouvinte de qualquer atividade e anula a possibilidade de produzir. As execuções das obras-primas tornam-se mais importantes que o simples ato de musicar, acessível, em princípio, a todos, tornando a música um consumo passivo. Há a cisão na música: a música que se escuta e a que se executa.
Retomada urgente da música como atividade criadora, e não apenas como uma mercadoria a ser consumida por uma massa amorfa!
É preciso desaparecer com a oposição artista x público. Recolocando o homem, em essência um ser criador, em posse integral de sua natureza criativa. Quantas pessoas já não ouvimos dizer (talvez nós mesmos já o tenhamos dito): “Eu não tenho voz boa para cantar”! É a máquina consumista impondo lamentáveis padrões vocais. O importante não é Ter uma voz assim ou assado, mas descobrir as possibilidades vocais – musicais - de cada indivíduo.
A prática musical nas escolas é incomensuravelmente mais importante que o ensino acadêmico e endurecido de um Conservatório, que visa formar profissionais. É preferível o amador: aquele que ama, e produz. O técnico às vezes está alienado inclusive de si mesmo. De sua potencialidade criadora, julgadora e ativa. A prática que vem pela escola vem acrescida dos hormônios, dos amigos, do amor, da descoberta. Não há notas, séries, provas. Apenas o mais importante: fazer. Não é só o esporte que pode ser antídoto para uma série de males que afligem nossas crianças e adolescentes: a música , dança, teatro, poesia também. Desde que em moldes de criatividade, de produção, de posse e não de imposição.
Regionalizar a cultura musical é diversificar. Aceitar o amador e a diferença. Trazer para as escolas, para os ouvidos que estão se formando, além da música de conservatório, a beleza da música regional, suas peculiaridades e, principalmente, sua forma de ser feita. Formar bandas e tocar nos coretos.
Tente um exercício extraído do livro “O autoconhecimento através da música”, de Peter Michael Hamel deite-se num lugar silencioso. Respire conscientemente. Aos poucos imagine a vogal que sente estar mais próxima de você. Com o tempo descobrirá qual é a “sua” vogal. Com muita cautela, pronuncie esta vogal. Não se preocupe se surgir um som “feio”. Não o modifique para um bonito e cantado. Deixe sair como sair. Repita vários dias. Após um certo tempo, começa-se a cantar sempre numa mesma altura. Você descobriu seu som próprio! Cante-o.
Musique seu próprio som.

Música à vista!

Quando Cabral descobriu o Brasil, gritou:
“- Música à vista!!”
O que, a bem da verdade, foi um santo remédio para ele que andava meio enfadado.

A tripulação se agitou não se sabe bem se por causa da variedade de sons ou por causa das “índias” a balançar os quadris.
Aportaram com espelhinhos, miçangas e bugigangas, mas os supostos “índios” estavam alvoroçados e não queriam saber daquelas quinquilharias.
Gritavam, entusiasmados:

- O pessoal da gravadora chegou! Estamos salvos!!

Cabral, de cara, se enfeitiçou por Tom Jobim, Chico Buarque, Vinícius, Caetano, Rita Lee, Gilberto Gil, Sinhô, Pixinguinha, Ismael, Noel, Geraldo Batista, Cartola...
Um sem-fim de povo bom de música.

Esperto como ele só, dono de um tino comercial enorme, que só perdia para seu senso de orientação, pensou:
- Isto cá é uma mina de ouro, ora pois!E sacou de seu portátil e gravou, pra começar, Garota de Ipanema e Carinhoso.
Foi o suficiente.
Certo de agradar seu rei, voltou a Portugal orgulhosíssimo da bagagem magnética que levava. É certo que a viagem de volta foi difícil, pois perdeu muito de sua tripulação que resolveu ficar para desfilar no Olodum e no Ilê, no carvanal da Bahia.

Quando chegou, explicou ao rei o porquê da baixa de marinheiros e mostrou-lhe a fita k7, dizendo:
- Isto aqui vale ouro, pois não!
- Não me diga bobagens, pois sim! Disse o rei com enfadamento.
- Meu rei, disse ele num jeito já meio baiano de ser, está na cara que esta música será a mais tocada no planeta. Vamos ficar ricos!
- Vamos? Ora, Cabral, olhe para mim e veja se preciso algo além do que aquelas terras abençoadas que você descobriu, apesar de ir na contramão. Vamos explorar a colônia e só!
- Meu rei, vamos montar uma gravadora vinculada com uma editora e ganhar o planeta!
- Cabral, a viagem lhe tirou os poucos miolos que você tinha. Deixa cá esta fita, confiscada, e vá conversar com Colombo sobre questões mais importantes. Estamos tendo muitos problemas. Além do mais, tamanho monte de ritmo é música de índio. Esquece, Cabral!

O rei confiscou a fita, mas diz-se que de vez em quando era visto cantarolando umas canções nada enfadadas.
Cabral mandou um email para o pessoal:“Índios, sua música não serve para o sucesso”.

Caetano estranhou:- Índio? Eu sou baiano, de Santo Amaro da Purificação!! E foi uma polêmica e tanto!

Mas acontece que os hacker dos Estados Unidos da nossa América tinham grampeado o computador de Cabral. E então ficaram sabendo que havia uma mina de ouro naquele país tropical cheio de “índios”. Mandaram agentes especiais, olheiros, que foram, devagar e sempre, selecionando alguns escolhidos para o sucesso, desde que fizessem algumas concessõezinhas, é claro, que nada vem de graça. Só vai.

Pra começo de conversa, toda “índia” que quisesse fazer sucesso, teria que ser loura. E foi uma correria aos supermercados para comprar o hene-maru super-blonder.E os brasileiros, que falavam português, elegeram uma portuguesa como símbolo com todos os penduricalhos de Cabral, a Carmem Miranda, ora pois, numa tentativa de agradar ao pessoal da “gravadora”. Alguns questionavam as concessões, mas eram uns chatos. Sucesso é bom e todo mundo gosta.

Muitos foram levados embora. Os que ficaram, morriam de fome física, mental e espiritual. Quando Frank Sinatra gravou Garota de Ipanema, Cabral processou o rei de Portugal por perdas e danos.Perdeu. E danou-se. Com todo espaço cedido, os gringos compraram nossas rádios com uma espécie de fruta chamada jabá e determinavam o que se gostava ou não.

Pior: determinaram que nossa música não tocava mais por aqui. Que a deles era melhor e coisa e tal. O músico-índio ficou surdo de esperar ouvir seu som tocando no rádio daqui.Hoje alguns estão felizes: quase já falamos inglês totalmente, acreditamos na globalização como uma forma democrática de expansão das nações, e que no fim-de-ano o Papai Noel nos realizará todos os desejos.

Outros continuamos na luta, batalhando pelo talento, pelo valor e a riqueza de nossos maxixes, que não tocam mais.

terça-feira, 11 de agosto de 2009

Felicidade - possibilidade 1

"O que é que eu quero e não tenho?"
"O que é que eu tenho e não quero?"

São as duas perguntas sobre as quais se medita, na tradição budista, para descobrir de onde parte o sofrer.

Nada será melhor amanhã se não aceitarmos nem usufruírmos o que temos agora.

A possibilidade de sermos felizes está em aceitar o que se tem.

Tudo que nos é dado tem e faz sentido.

Shotaro Shimada