quinta-feira, 24 de fevereiro de 2022
Somos classificados a cada mínimo suspiro como facistas, comunistas, genocidas, marxistas, nazistas, homofóbicos, machistas, feministas, racista, direitista, esquerdistas, macumbistas, mais um milhão de rótulos.
Tornamo-nos anti-tudo.
Inclusive e principalmente anti-gente.
A pandemia não piorou nada: só escancarou o que já estava ali.
O mundo virou um FLAxFLU, com direito a porrada e marretada no outro mesmo antes do jogo acabar.
Só que eu sou o outro do outro.
Que falta faz um abraço daqueles de urso - lembra?
Um abraço sem máscara
De peito aberto
Sem medo
Uma água-viva queima.
Uma água-vida morta é um grande catarro. Um zumbi. Com ou sem máscara.
Mas a vida não se detém e lá vem a onda do mar…
segunda-feira, 21 de fevereiro de 2022
A VOLTA DO QUE NÃO FOI
Conheci o Larica Total num
momento total flex feliz da minha vida, através do meu marido atual, o
terceiro. Sim. Terceiro. Eu Acredito no casamento.
Tá rindo de que?
Meu mapa astral tem sete astros
na casa do casamento. Amei os três
imensamente. Amo ainda. Só que não é fácil administrar tanta influência astrológica
no meu dia a dia. Vou me virando.
Ele me chamou para curtir uma
lareira e ouvir uns discos de vinil. Achei a cantada mais tosca do mundo, pois
não achava possível uma lareira num apartamento. Ardi em brasas quando ele
tocou lenha.
Do lado da lareira, um sofá. Do
lado do sofá, uma tevê. Explodindo tudo, o Larica.
Aquele mundo de panelas perfeitas
– que eu não tinha; de receitas perfeitas – que eu não conseguia nunca repetir;
de casamentos bem cozidos – que eu queimei, torrei como carvão, finalmente entravam
na real: busquei tanto tempo por respostas incríveis, não percebi que estava
ali bem na minha frente: a faca de pão multiuso. Numa metáfora quase crística:
a solução num abrir de gavetas.
Casei. De novo.
O Larica foi morrendo.... as
reprises já não satisfaziam mais.
De repente, uma invasão de forno,
fogão, língua e digestão:
Perto do fogo (não mais a lareira),
receitas que funcionam (evidente que não as minhas), naturebas com barbatanas
do Himalaia, cozinha-marcenaria, exigências infantis – que seja doce ou com
chatos pra comer, esperanças de marravilha no francês forçado, os masterchefs
(virou guerra isso), bela cozinha, pesadelo cozinha, pancs (que catso isso
agora?). Nem sei quê mais.
A vida se complexificou em dez
anos.
E então, como um bolo que sola,
ressurge o Larica, só podendo vir de outro planeta mesmo.
Nem precisava do mesmo apê, da
faca de pão, da panela preta, da cueca vermelha.
Não precisa voltar. Não dá pra
voltar. Larica Total não precisa de âncora.
Faca elétrica ou a total flex de
pão, na rua na chuva ou na fazenda - qualquer lugar é lugar de vida.
Se lixe a volta. Os
ex-casamentos. A lareira. A panela preta.
Larica é presente. É teatro invisível
vivo. É voo livre.
Sem roteiros, sem pratos
requentados.
É pimenta no olho. É fogão da liberdade.
Larica é fodex.
quarta-feira, 9 de fevereiro de 2022
O QUE TEM PRA COMER?
Hoje entrei numa lojinha de orgânicos, aqui perto de casa.
Fiquei uns segundos do outro lado da rua... entro ou não entro? Quero conhecer
a loja e os produtos, mas esse povo costuma ser meio chato que critica tudo e
se acha superior. Pra toda teoria, tem
um chato que se justifica atrás dela.
Mas, meu coração – ah... meu coração - me diz: tamo tudo junto.
Então juntei minha racionalidade construída, meu sentimento natural e trouxe meu corpo, direcionando meus pés para a
porta da loja. Venci minha resistência. Entrei.
Lá dentro, um ar-condicionado gostoso, uma lojinha pequena e
aconchegante, uns pimentões, tomates, batatas, hortaliças e a Renata. De fita
cor-de-rosa no cabelo e máscara preta no rosto. Ela vai me explicando como
funciona a loja, a entrega, o QRCode, o site e exala uma tranquilidade
cheirosa, como uma horta.
Então vem a pergunta inevitável, que pode estragar todo o clima:
- Você vegetariana?
- Eu não sou vegetariana, Renata.
- Vegana?
Não sou vegana.
Não sou carnívora.
Não sou ovolactovegetariana
Não sou pesco-vegetariana.
Nem flexitariana.
Nem onívora.
Nem crudívora.
Tem mais algum nome que
esqueci?
Lembro de uma fala que ouvi num
templo budista (não, não sou budista):
“Aqui comemos o que recebemos em doação. Não cremos ser justo recusar ou
escolher alimento”.
Minha postura em relação à
comida é gastro-ecumênica.
Toda comida que nos chega
à mesa é sagrada.
O que tem para comer?
Comemos com alegria.
A Renata sorriu com os
olhos.
Obs.: Ainda quero experimentar
o pé de galinha que minha nora adora!